terça-feira, 30 de setembro de 2014

O FANATISMO ANGOLANO

Quando há dias publiquei o “Fanatismo Angolano rapidamente me apercebi do turbilhão de emoções que causei pelas várias “comentários que recebi e obviamente uns mais favoráveis do que outros como seria de esperar. Todos nós temos o direito de em liberdade democrática expressar os nossos pontos de vista, desde que as mesmas se enquadrem dentro das normas cívicas de respeito pelas opiniões de terceiros. O problema político das nossas Colónias era antigo e o governo de Salazar e Caetano foram ignorando e protelando durante tempo demais um problema de auto determinação que se avizinhava a passos largos e o qual acabou por degenerar numa guerra colonial em vários continentes. O conflito começou na Índia e pouco depois alastrou-se a outras colónias em África. Depois do golpe de estado no dia 25 de Abril de 1974, e das convulsões politicas em Portugal a situação nas Províncias Ultramarinas agravou-se, devido á pressão exercida pela esquerda radical Portuguesa para que as Colónias fossem rapidamente entregues aos movimentos de libertação, após eleições democráticas. Só que esse programa não foi cumprido, nunca houve eleições e as colónias foram entregues aos líderes dos movimentos de tendência comunista, que eram na altura, apadrinhados pelas forças de esquerda radical que governava Portugal. Após este preambulo vou então centrar o texto nos trágicos acontecimentos que originaram que cerca de 750 mil Repatriados, Refugiados ou Retornados que pela força das circunstâncias se viram obrigados a deixar as Ex-Colónias ou Províncias Ultramarinas como eufemísticamente lhes queiram chamar, em virtude de terem sido abandonados pelo Governo Português que em 1975 governava Portugal, e cujos seus intervenientes terão um dia que responder perante a História quando esta for contada sem complexos, e os carrascos da descolonização publicamente identificados como vendilhões da pátria. Mário Soares que foi um deles, era ao tempo, Ministro dos Negócios Estrangeiros e foi ele que liderou o processo da entrega das Colónias em negociações tidas em Argel e Lusaka. Soares pactuava descaradamente com os movimentos de libertação nas diferentes Províncias Ultramarinas que seguiam uma orientação Marxista. A sua função específica como moço de recados foi a de entregar aos líderes nacionalistas numa bandeja a vida e os bens dos Portugueses que lá residiam, sem que o seu futuro fosse acautelado e protegido. Obvio que essa descolonização descambou como seria de esperar, não só devido á guerra fratricida entre os próprios movimentos independentistas, como depois mais tarde particularmente em Angola o MPLA adquiriu superioridade bélica com a ajuda do Almirante Rosa Coutinho, acabando por expulsar das cidades a FNLA e UNITA. Após terem conseguido essa supremacia centraram a sua actividade em amedrontar e aterrorizar os portugueses residentes gerando um êxodo idêntico ao dos Judeus expulsos do Egipto ou dos Asiáticos do Uganda por Idi Amin. Cada Português que abandonou quer Angola ou Moçambique, terá certamente as suas experiências pessoais para contar que nesta altura passados 38 anos, já passaram de pais para filhos. Não tenho a pretensão de fazer a história da descolonização, mas apenas dissecar alguns dos aspectos daquela que foi feita em Angola, e que continuam a afectar ainda hoje milhares de portugueses que lá viveram e que não se conseguem libertar desse sindroma que os marcou negativamente para a vida inteira. Em boa verdade quando o primeiro texto foi publicado nunca pensei que tantas pessoas se manifestassem de forma tão diversa e variada. I ideia não foi a de atirar achas para a fogueira nem incendiar sentimentos ou emoções de quem ainda os mantêm recalcados e que passados tantos anos deveriam já ter sido dissipados ou esquecidos. O que menos desejaria era que o texto em questão fosse lido ou interpretado como uma provocação, mas apenas como uma reflexão desapaixonada que também como ex-residente naquela província Ultramarina me permito fazer. Apercebi-me contudo, que ainda hoje passados 38 anos, essas pessoas, continuam desajustadas e desenquadradas das novas vidas que foram obrigadas a reconstruir numa terra para muitos estranha e com a qual não tinham nenhuma ligação afectiva ou identificação. Mercê desse facto continuam a viver intensamente o passado que teimam em não esquecer, recusando-se a viver o presente, como se fosse uma situação temporária na esperança de voltarem um dia e encontrarem tudo na mesma. Este drama de continuarem a sonhar com Angola deve ser extremamente traumático e penoso. Para eles a vida parou no dia que deixaram aquela terra. Portugal Continental serviu de plataforma temporária para emigrarem de novo para outros países, mas os que decidiram ficar continuam inadaptados e desenraizados da terra que os viu nascer ou pela qual optaram escolher e ficar. Eu pensaria que o distanciamento no tempo lhes permitisse uma análise racional e clarividente dos acontecimentos, mas pelas “postagens” que fazem diariamente nestas páginas vejo que não. As pessoas podem não esquecer o cheiro da terra molhada, nem dos inigualáveis por do sol ou do saboroso bacalhau doVilela ou das sandes de presunto do Baleizão, do sabor da galinha cabiri, ou de uma boa moamba, tudo isso eu aceito e compreendo. Contudo por outro lado também não podem nem devem esquecer que foram escorraçados, os nossos bens delapidados, valores roubados, e que muitos portugueses lá morreram ou desapareceram em circunstâncias misteriosas durante esse período conturbado do Governo de Transição. Eu tenho conhecimento pessoal de alguns amigos meus, que durante a noite as suas residências foram invadidas por fuzileiros ás ordens do Almirante Rosa Coutinho e essas pessoas foram posteriormente entregues a civis do MPLA, para serem interrogados durante semanas a fio, e depois abandonados em locais ermos durante a noite. Para aqueles que têm a memória curta aconselho-os a ouvir de novo o discurso do Agostinho Neto feito em Catete, depois da sua chegada a Luanda referindo-se aos colonos Portugueses. Que muitos dos Portugueses que lá viveram tenham saudades e recordações desses tempos eu admito e compreendo, pois também lá passei a minha juventude, adolescência e vida adulta, agora não conseguirem cortar o cordão umbilical que os liga a uns pais estrangeiro em que nada se assemelha aquilo que era antes do 25 de Abril é que eu não consigo entender. As pessoas continuam mentalmente ainda a viver e respirar o ar de Angola, parecendo que sufocam se diariamente não falarem daquela terra que os enfeitiçou. Não existe qualquer semelhança entre a Angola de 1975 e 2013, que as elites governamentais corruptas continuem a roubar o povo, que utilizaram ao tempo e que foi chamado de “Poder Popular”, para entrarem pelas nossas casas, fazendas, roças expulsando-nos, e apropriando-se dos nossos bens como já o tinham feito em 1961, a mim não me preocupa nada, pois ladrão que rouba ladrão segundo o aforismo pode ter cem anos de perdão, mas o meu certamente nunca o terão, pois nem a minha memória é curta, nem aquilo que os meus olhos viram alguma vez esquecerão. Senti-me violentado nos meus direitos, portanto foi um período negro da minha vida que esqueci há muitos anos. Confesso que de Angola não tenho saudades e as más recordações fizeram-me esquecer as boas que tinha. O solo Angolano estando ensopado em sangue não tem culpa nem é responsável por quem o pisa ou nele habita, nem pelos desmandos que nele foram feitos, só que não podemos olhar para ele ignorando ou dissociando-o de quem foram os causadores de uma das maiores atrocidades e desgraças que culminaram com um dos maiores êxodos do século XX envergonhando Portugal aos olhos do mundo civilizado. Quando somos mal servidos num restaurante quer pela comida ou desleixo dos empregados, por norma não voltamos lá, nem o mesmo nos deixa saudades. Se vamos de férias a um país e nele somos agredidos e roubados, também não podemos dizer muito bem dele, portanto é este paradoxo de dois pesos e duas medidas que eu tento realçar e colocar em evidência quando se trata falarmos sobre Angola. Também não vejo este sentimento que persisto em chamar de doentio em relação aos outros Portugueses que saíram de Timor, Cabo Verde, Guiné, S.Tomé e Príncipe ou mesmo Moçambique. Será que a água do Bengo tinha realmente efeitos que possamos considerar de poção mágica que tenha enfeitiçado quem a tivesse bebido. Se assim foi, confesso que só fui afectado por algum tempo, porque quando coloco a minha vida passada em Angola no prato da balança, o sofrimento, a angustia, a frustração de me ver indigente numa terra desconhecida que era Portugal, onde fui mal recebido, mal amado e ainda por cima de novo maltratado, tenho que ser realista, e as saudades, do cheiro da terra vermelha e molhada, da gastronomia, paisagens naturais, pesca, caça, pores do sol e tudo o mais, pouco pesam no computo geral da ignominia a que eu e a minha família fomos submetidos. Angola e os Angolanos atraiçoaram-me expulsando-me do seu território pois senti na pele o medo e o terror de lá deixar ficar os meus ossos aos 32 anos de idade, só porque a cor da minha pele era branca. Que ninguém me peça que olhe para Angola e que a veja apenas até ao dia 25 de Abril de 1974, pois se o fizesse estaria a enganar-me a mim próprio, a tapar o sol com uma peneira, pactuando e ocultando tudo o que se passou até á independência unilateral dessa Republica da Bananas a 10 de Novembro de 1975. Podem de novo crucificar-me pelo que acabei de escrever, mas oxalá que não tenham que me ressuscitar um dia dando-me razão. Vilamoura 29-5-2013

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