sábado, 14 de março de 2015

DIPLOMACIA

Hoje vou iniciar este texto recorrendo às minhas lucubrações nocturnas com uma parábola que alguém me contou há muitos anos mas a qual nunca mais esqueci. De certa forma ela é representativa de como interpreto as verdades ou falsidades da vida e de como atractivamente nos podem ser apresentadas, mesmo que disfarçadamente nos possam ser entregues como presentes dourados mas que hipocritamente vêm envenenados. Penso que esses “recados” devem ser verbalizadas a terceiros independentemente do seu conteúdo de forma simples e objectiva tal como o primeiro adivinho usou para transmitir a sua verdade a qual foi embrulhada numa semântica pouco atractiva que irou e desgostou o rei. Não penso que as pessoas se devam penitenciar pela forma como estruturam os seus discursos, sejam eles de louvor ou critica ou como os destinatários os recebem. Desde que a mensagens sejam entregues a dureza ou elogio nelas contidas devem ter a finalidade de expressar sem tibiezas a visão de agradecimento e reconhecimento de quem manda em relação aos agraciados ou o raspanete aos desleixados. Há quem prefira entregar diplomaticamente a missiva ou a “Carta a Garcia”, embrulhada de forma sugestiva e com palavras doces levando o destinatário a pensar que está a ir para o céu num voo em primeira classe, quando em boa verdade o seu destino é o inferno, mas mesmo assim fica agradecido. Aqui vai a história, a que eu chamo “Maneiras de Dizer as Coisas”, se bem que não tenha a pretensão que se torne num manual de etiqueta. Uma sábia história árabe diz que, certa feita, um sultão sonhou que havia perdido todos os dentes. Logo que despertou, mandou chamar um adivinho para que interpretasse seu sonho. - Que desgraça, senhor! Exclamou o adivinho. -Cada dente caído representa a perda de um parente de vossa majestade - Mas que insolente gritou o sultão, enfurecido. ¬-Como te atreves a dizer-me semelhante coisa? -Fora daqui! Chamou os guardas e ordenou que lhe dessem cem açoites. Mandou que trouxessem outro adivinho e contou-lhe o sonho. Este, após ouvir o sultão com atenção, disse-lhe: - Excelso senhor! Grande felicidade vos está reservada. O sonho significa que haveis de sobreviver a todos os vossos parentes por muitos e longos anos. A fisionomia do sultão iluminou-se num sorriso, e ele mandou dar cem moedas de ouro ao segundo adivinho. E quando este saia do palácio, um dos cortesãos disse-lhe admirado: - Não é possível! A interpretação que você fez foi a mesma que o seu colega havia feito. Não entendo porque ao primeiro ele pagou com cem açoites e a você com cem moedas de ouro, - Lembra-te meu amigo - respondeu o adivinho - que tudo depende da maneira de dizer...Um dos grandes desafios da humanidade e aprender a arte de comunicar. Da comunicação depende, muitas vezes, a felicidade ou a desgraça, a paz ou a guerra. Que a verdade deve ser dita em qualquer situação, não resta dúvida, mas na forma com a mesma é comunicada ou entendida é que reside o problema, porque muitas vezes aquilo que dizemos é ouvido ou interpretado de forma diferente o que tem provocado em alguns casos grandes problemas. A verdade pode ser comparada a uma pedra preciosa. Se a lançarmos no rosto de alguém pode ferir, provocando dor e revolta. Mas se a envolvemos em delicada embalagem e a oferecemos com ternura, certamente será aceite com facilidade. A embalagem, nesse caso, é a indulgência, o carinho, a compreensão e, acima de tudo, a vontade sincera de ajudar a pessoa a quem nos dirigimos. Ademais, será sábio de nossa parte se antes de dizer aos outros o que julgamos ser uma verdade, dizê-la a nós mesmos diante do espelho. E, conforme seja a nossa reacção, podemos seguir em frente ou deixar de lado o nosso intento. Importante mesmo, é ter sempre em mente que o que fará diferença e a maneira de dizer as “coisas.” Alguém uma vez disse que a Diplomacia é a arte de mandar alguém para o inferno pensando essa pessoa que vai a caminho do céu. No fundo os mundos que escolhemos para viver ou passar o tempo são aquilo que nós pretendemos ou imaginamos que reúnem todos os requisitos que nos agradam sejam eles mundos perfeitos ou imperfeitos de acordo como a sociedade os classifica. Eu penso que a vida está dividida em três segmentos percentuais. Eu diria que em 80% das ocasiões podemos definir, controlar, evitar, prevenir, remediar certos acontecimentos com que a mesma nos confronta. Noutros aspectos em 15% deles nada podemos fazer, pois a sua imponderabilidade ou inevitabilidade não pode ser previsível nem está nas nossas mãos evitar que certas ocorrências tenham lugar. E finalmente restam 5% que são factores de pura sorte e que de um momento para o outro podem vir a alterar definitivamente o curso das nossas vidas. Mas não me venham com as histórias fatalistas que é o nosso destino está traçado desde que nascemos, ou que decide por nós o que vamos fazer ou ser nas nossas vidas e quais os caminhos que iremos percorrer. O destino de cada um é da nossa inteira responsabilidade e de como exercemos as nossas opções e fazemos as nossas escolhas. Não imputemos essa responsabilidade a Deuses, nem arranjemos bodes expiatórios para assacarem com os nossos fracassos, pois para sucessos não os desejamos repartir com ninguém, queremos subir ao pódio sozinhos. É contudo importante, que aprendamos com os erros que cometemos minimizando-os e maximizando as coisas boas, mas infelizmente há certas pessoas que pensam ter nascido sob a estrela do fatalismo, perseguição ou azar tornando as suas próprias vidas num inferno, estes são aqueles que já nasceram vencidos e que cedo ou tarde acabarão por cair na berma da estrada, pois aceitam a vida conforme esta lhes é adversa e nada fazem para lutar, tentando mudar o curso dos acontecimentos. Os vencedores até se riem e agradecem, pois adoram os desafios e as provocações com que a vida os confronta, porque lhes permite, avançar, crescer e desenvolver as suas técnicas de sobrevivência uma vez que estão mentalmente apetrechados com as ferramentas necessárias para resolverem com sucesso os problemas e as ciladas do quotidiano que a cada passo e ao voltar de cada esquina nos são apresentados de uma forma sugestiva e enganadora, mas que por muito bem disfarçada ou dissimulada que se nos apresente, será sempre derrotada pela nossa força demolidora de vencer todos os obstáculos. Que ninguém pense que a vida é altruísta e nos dá tudo o que precisamos ou gostamos gratuitamente de mão beijada, antes pelo contrário está sempre pronta para nos retirar os momentos de felicidade e reduzir ao mínimo tudo aquilo que nos dá gozo e prazer, racionando os períodos em que exultamos de alegria com longos espaços temporais de sofrimento pela aridez das caminhadas que temos de calcorrear até descobrirmos o nosso norte magnético que nos permita encontrar o que desejamos. Todos nós, a espaços, temos os nossos momentos onde tudo parece bater certo, vivemos no local certo, temos os amigos que nos preenchem e estimulam, estamos profissionalmente realizados, partilhamos a vida com alguém em paixão, delírio e por vezes em êxtase, portanto todos os ingredientes se combinam para que o cozinhado seja delicioso. Quando esses “privilégios” nos são retirados, a grande maioria dos que são afectados acabam por se revoltar contra a vida e cheios de raiva, azedume e frustração iniciam processos de auto flagelação impiedosa que os leva a depressões psíquicas de difícil recuperação. Quando esses momentos de vivência perfeita terminam é preciso relembrar de que a felicidade não é um meio continuo e permanente de transporte, mas sim uma estação aonde chegamos e obrigatoriamente temos de sair e esperar até conseguirmos apanhar outra carreira que nos leve para o destino a que nos propomos chegar, só que essa espera pode demorar dias, semanas, meses, ou anos, pois os transportes vão cheios ou a cara dos condutores não nos agrada. Contudo se a forças e intensidade do sonho e do amor não nos abandonarem nessas fases críticas de baixo astral, poderemos sempre se formos perseverantes e determinados encontrar alternativas para chegarmos ao nosso destino por um percurso alternativo de paisagem diferente do que aquele a que habitualmente devido à rotina do nosso quotidiano fazia parte da nossa escolha inicial. Se acreditamos no nosso valor e nas nossas capacidades de resistência para com as adversidades da vida não nos podemos resignar a passar ao lado dela ou a deixar que terceiros decidam por nós. Nesses momentos críticos é essencial manter sempre todos os nossos sentidos em estado de alerta, pois a sorte ou as coincidências não acontecem ou batem às nossas portas duas vezes seguidas. Os milagres apenas existem para os devotos religiosos possuídos de mentes débeis que pagam aos pastores evangélicos ungidos divinamente para que em cenas teatrais bem ensaiadas façam os milagres acontecer. O nosso coração será sempre a pedra de toque que nos sinalizará quando as coisas começam a acontecer, é uma mutação como o mudar de uma estação, como se fosse a primavera a chegar dentro dos nossos corações, as cores e os aromas das flores parecem tornar-se mais sensuais, os ventos mornos vão lentamente varrendo a poeira dos nossos olhos para que passemos a usufruir do estado amoroso que repousa para além das turbulências da vida. Nesses momentos de encantamento, e receptividade, até deixarmos que a chuva delicadamente chegue ao jardim do nosso coração insuflando vida nas plantas que lá vivem e as quais quase murcharam pelo longo estio e seca dos últimos anos. Nessas alturas é-nos dado ver e aperceber como a regeneração lenta e progressiva acabará por restaurar convicções perdidas, sentimentos adormecidos que são o resultado de eventos ou contenciosos mal resolvidos, percas irreparáveis e de feridas mal curadas. De novo voltamos a acordar para a vida depois de períodos mais ou menos longos de hibernação anestésica e emocional voltando a ter um comportamento humano em vez de continuarmos a agir como robots insensíveis ao mundo que nos rodeia. Quando algo dentro de nós é ferido ou quebrado, usualmente o processo de regeneração torna-se lento e doloroso até que de novo consigamos devolver a nós próprios o respeito, auto-estima, alegria de viver voltando a adquirir o equilíbrio e o estado de paz espiritual para que comecemos a ver de novo o mundo com outra atitude de confiança, e nos leve a flutuar no azul celeste do Universo. Neste acordar ou renascer para a vida, sentimos que o ar que se renova e que a vida se prepara para encetar um novo ciclo, e, nessa esperança, começamos a alicerçar as bases que nos ajudarão a ser mais tolerantes, flexíveis, compreensivos, mas acima de tudo adquirir a capacidade de perdoar quando as circunstâncias assim o exigem. A vida implica que estejamos atentos, para tudo que está dentro e fora de nós, nada está connosco ao acaso, tudo se move lentamente, dando-nos a oportunidade de aprendermos, dia a dia, as armadilhas e incongruências da vida, pois esta não facilita, não dá borlas, não se compadece, nem mesmo quando nos atrasamos a curtir desgostos ou a celebrar alegrias. Nesta fase, nada nos é pedido em troca, a não ser vivermos na verdade, dar prioridade ao essencial e ter um plano de vida, pois quem não o faz está certamente destinada ao fracasso. Existem pessoas que se tentam esconder nas profundezas dos mundos que criam para que a vida não as descubra, mas mais tarde ou mais cedo quando menos esperamos somos descobertos com o rabo de fora, e, quando isso acontece, a vida usa da maior crueldade possível com punições bem longas, lentas e dolorosas. Há um velho ditado que diz: “Não há bem que sempre dure nem mal que se não acabe”, portanto se nos consciencializarmos disso já devemos estar preparados para viver períodos de tempo nos píncaros iluminados e outros nos vales sombrios, por outras palavras não nos devemos deslumbrar quando a vida nos corre bem, nem devemos ficar desapontados ou deprimidos quando ela nos corre mal, uma vez que é um dado adquirido que isso nos vai acontecer ciclicamente ao longo do nosso período existencial. Para evitar, prevenir ou remediar devemos ter dois planos de vida distintos, uma para quando ela nos corre bem e outra para quando nos corre mal. O segredo é amealhar tipo parábola da “formiga e cigarra”, durante o período das “vacas gordas” traduzido pelos períodos de fartura e abundância para podermos fazer face ao período das “vacas magras” quando precisamos de apertar o cinto. Tanto uma situação como a outra têm várias faces e fases como a lua, que nos atingem em diferentes áreas e períodos das nossas vidas com maior luminosidade ou obscuridade. O leque das agruras é longo e variado podendo cobrir áreas de ordem financeira, pessoal, familiares, profissionais, saúde ou amorosas. Há que saber gerir os acontecimentos que ocorrem nas nossas vidas sejam eles de que ordem for, evitando que os mesmos nos projectem para estados de alma alienatórios de euforia ou depressão desproporcionados. Devemos controlar os acontecimentos ocorridos nas nossas vidas de forma a não cairmos em atoleiros de areias movediças, ou poços sem fundo, bem como não nos deixarmos levar por um “Porta-aviões” na esperança e expectativa que com ela possamos sentirmo-nos transportados para a estratosfera numa vivência desprovida de gravidade. No primeiro dos casos muito dificilmente as pessoas sairão sozinhos sem a ajuda de depressivos, no segundo, são oportunidades únicas de vida efémera que estão á partida condenados a não ter perpetuidade. 17-1-2007

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