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segunda-feira, 7 de setembro de 2015
A VERDADE QUE MATOU A SAUDADE
Obviamente que com a publicação dos meus textos concedendo-lhes a oportunidade de conhecerem a luz do dia e assumindo a responsabilidade de publicamente expor as minhas reflexões que guardei para memória futura, dou a liberdade de ser lido e interpretado consoante as experiências pessoais de cada um relativamente a um denominador comum ao qual todos fomos submetidos em períodos e escalões etários diferentes das nossas vidas. Sendo o risco elevado de ser vilipendiado, mesmo assim, estou preparado para tirar a armadura e o colete á prova de bala e enfrentar as diferentes sensibilidades que de antemão irei encontrar na abordagem que tenciono fazer.
Não querendo passar por ingénuo antevejo que os tópicos que pretendo analisar, possam gerar alguma polémica, muito embora já tenham passado umas dezenas de anos não estarei muito longe da verdade ao afirmar que muitos deles ainda se encontram demasiado á flor da pele em muitas mentes e corações, e quando neles remexemos, é como se víssemos de novo projectar-se no ecrã do nosso occipital o filme desses traumáticos dias.
A minha intenção é fazer essa projecção em camara lenta tentando maximizar o efeito enquanto passo as imagens que escolhi as quais espero abram a caixa de pandora dos leitores libertando sentimentos e gerando emoções, as quais podem obviamente diferir das minhas. Não venho á procura de améns ou simpatias, apenas me limitarei a relatar factos e depois que cada um tire as suas ilações comentando-as se assim entenderem ou simplesmente ignorando o texto.
Não sou pessoa para cultivar ódios de estimação, mas confesso que também não sofro de amnésia e muito menos fiquei em coma durante 40 anos.
Quando coloco no prato da balança tudo aquilo que perdi em Angola, comparativamente com o que ganhei depois de a abandonar, o saldo é definitivamente positivo em todos os aspectos que nem me vou dar ao trabalho de enumerar. Acho que tenho de agradecer em ter sido pontapeado da terra onde nasci pelo MPLA, pois se lá tenho ficado pouco mais teria evoluído e não me refiro ao aspecto académico ou financeiro, mas sim ao profissional, pois o primeiro já fazia parte indissociável do meu património intelectual.
Todos nós temos o direito de em liberdade democrática expressar os nossos pontos de vista, desde que os mesmos se enquadrem dentro das normas cívicas de respeito pelas opiniões de terceiros.
O problema político em relação ao desejo de auto determinação das nossas possessões ultramarinas era antigo e já se manifestava no final dos anos 50. Os governos de Salazar e Caetano fizeram orelhas moucas e rejeitaram durante ouvir os líderes dos movimentos de libertação que se tinham constituído para que de uma forma pacífica pudessem ser considerados interlocutores válidos para negociar com o governo fascista que governava Portugal. Devido à estupidez primeiro do ditador Salazar e depois de Marcelo Caetano, o problema colonial acabou por degenerar numa guerra colonial que alastrou por várias colónias em diferentes continentes.
O conflito começou na Índia ainda no tempo de Salazar, e pouco depois propagou-se rapidamente para outras frentes de combate em África.
Depois do golpe de estado no dia 25 de Abril de 1974, e das convulsões politicas em Portugal a situação nas Províncias Ultramarinas agravou-se, devido á pressão exercida pela esquerda radical Portuguesa para que as Colónias fossem rapidamente entregues aos movimentos de libertação, após eleições democráticas. Só que o Acordo do Alvor nunca foi cumprido, e as colónias acabaram por ser unilateralmente entregues aos líderes dos movimentos de tendência comunista, que eram na altura, apadrinhados pelas forças de esquerda radical que governava Portugal.
Após este preâmbulo vou então centrar o texto nos trágicos acontecimentos que originaram que cerca de 750 mil Repatriados, Refugiados ou Retornados que pela força das circunstâncias se viram obrigados a deixar as Ex-Colónias ou Províncias Ultramarinas como eufemisticamente lhes queiram chamar, em virtude de terem sido abandonados pelo Governo Português à sua sorte. Faço votos para que todos os intervenientes no processo de descolonização ainda vivos tenham um dia que responder perante a História ou no tribunal internacional em Haia, quando existir alguém ou alguma organização que sem complexos os responsabilize publicamente por terem agido como cúmplices entregando os seus compatriotas aos terroristas do MPLA, para que estes fizessem o papel de carrascos que lhes competia, que era o de obrigar os colonos a debandar utilizando várias formas concebidas para esse fim. Os vendilhões da nossa pátria estão identificados, e os terroristas angolanos também, alguns já foram desta para a melhor, e só lamento que os que ainda por aqui e por lá andam não possam ser encostados a uma parede e fuzilados.
Mário Soares que foi um deles, era ao tempo, Ministro dos Negócios Estrangeiros e foi ele que liderou o processo da entrega das Colónias em negociações tidas em Argel e Lusaka. Soares pactuava descaradamente com os movimentos de libertação nas diferentes Províncias Ultramarinas que seguiam uma orientação Marxista.
A sua função específica como moço de recados de Melo Antunes, foi a de entregar aos líderes nacionalistas numa bandeja a vida e os bens dos Portugueses que lá residiam, sem que o seu futuro fosse acautelado e protegido. Obvio que essa descolonização descambou como seria de esperar, não só devido á guerra fratricida entre os próprios movimentos independentistas, como depois mais tarde particularmente em Luanda onde o MPLA adquiriu superioridade bélica com a ajuda do Almirante Rosa Coutinho, acabando por expulsar das cidades mais importantes a FNLA e UNITA. Após terem conseguido essa supremacia centraram a sua actividade em amedrontar e aterrorizar os portugueses residentes gerando um êxodo idêntico ao dos Judeus expulsos do Egipto ou dos Asiáticos do Uganda por Idi Amin.
Cada Português que abandonou quer Angola ou Moçambique, terá certamente as suas experiências pessoais para contar, que nesta altura 40 anos depois, já passaram de pais para filhos. Não tenho a pretensão de fazer a história da descolonização, mas apenas dissecar alguns dos aspectos daquela que foi feita em Angola, e que continuam a afectar ainda hoje milhares de portugueses que lá viveram e que não se conseguem libertar desse síndroma que os marcou negativamente para a vida inteira.
Desejo vivamente reiterar que a minha ideia não é minha intenção atirar achas para a fogueira provocando quem quer seja com as minhas reflexões desapaixonadas como natural e ex-residente daquela Província Ultramarina.
Por todos os lamentos saudosistas que leio quase que diariamente por estas páginas de Retornados ou Refugiados, apercebi-me facilmente de que passados 40 anos, algumas dessas pessoas, ainda continuam desajustadas e desenquadradas das novas vidas que foram obrigadas a reconstruir numa terra para muitos estranha e com a qual não tinham nenhuma ligação afectiva ou identificação.
Mercê desse facto continuam a viver intensamente o passado que teimam em não esquecer, recusando-se a aceitar o presente, como se fosse uma situação temporária na esperança de voltarem um dia e encontrarem tudo na mesma à sua espera, como se a projecção do filme tivesse sido interrompida para fumarmos um cigarro e comer umas pipocas em Novembro de 1975, e a campainha começasse a tocar para nos avisar de que nos devíamos sentar para viver a segunda parte das nossas vidas 40 anos depois que se iriam de novo reiniciar. Este drama de continuarem a sonhar com Angola deve ser extremamente traumático e penoso, pois para todos eles a vida parou no dia que deixaram aquela terra. Portugal Continental serviu de plataforma temporária para alguns emigrarem de novo para outros países, mas os que decidiram ficar, muitos continuam inadaptados e desenraizados da terra que os viu nascer ou pela qual optaram escolher e ficar.
Eu pensaria que o distanciamento no tempo lhes permitisse uma análise racional e clarividente dos acontecimentos, mas pelas “postagens” que fazem diariamente nestas páginas vejo que não. As pessoas podem não esquecer o cheiro da terra molhada, nem dos inigualáveis por do sol ou do saboroso bacalhau do Vilela ou das sandes de presunto do Baleizão, do sabor da galinha cabíri, ou de uma boa muamba, tudo isso eu aceito e compreendo, muito embora todos esses pratos possam hoje ser confeccionados em Portugal com o mesmo delicioso sabor e temperos.
Contudo por outro lado também não podem nem devem esquecer que fomos escorraçados, os nossos bens delapidados, valores roubados, e que muitos portugueses lá morreram ou desapareceram em circunstâncias misteriosas durante esse período conturbado do Governo de Transição. Eu tenho conhecimento pessoal de alguns amigos meus, que durante a noite as suas residências foram invadidas por fuzileiros ás ordens do Almirante Rosa Coutinho e essas pessoas foram posteriormente entregues a civis do MPLA, para serem interrogados durante semanas a fio, e depois abandonados em locais ermos durante a noite. Para aqueles que têm a memória curta aconselho-os a ouvir de novo o discurso do Agostinho Neto feito em Catete, depois da sua chegada a Luanda referindo-se aos colonos Portugueses. Que muitos dos Portugueses que lá viveram tenham saudades e recordações desses tempos eu admito e compreendo, pois também lá passei a minha juventude, adolescência e vida adulta. A Angola de hoje em território e pessoas em nada se assemelha com terra que lá deixamos. As pessoas continuam mental e pulmonarmente ainda a viver e respirar o ar de Angola, parecendo que sufocam se diariamente não falarem daquela terra que os enfeitiçou, ou verem fotos antigas das casas onde viveram, das ruas onde moravam, das escolas que frequentavam e dos cinemas onde iam.
As elites governamentais corruptas continuem a roubar o país e a explorar o povo, que utilizaram quando lhes convém e que ao tempo foi chamado de “Poder Popular” A única diferença entre 1961 e 1975 é que não houveram mortes violentas dos colonos, mas entraram na mesma pelas nossas casas roubando tudo e expulsando-nos particularmente nos subúrbios de Luanda, mas mesmo assim alguns desapareceram e outros morreram.
Pessoalmente senti-me violentado nos meus direitos, portanto foi um período negro da minha vida que esqueci há muitos anos. Tenho honestamente que admitir que de Angola não tenho saudades e as más recordações fizeram-me esquecer as boas que tinha. O solo Angolano estando ensopado em sangue não tem culpa nem é responsável por quem o pisa ou nele habita, nem pelos desmandos que nele foram feitos, só que não podemos olhar para ele ignorando ou dissociando-o de quem foram os causadores de uma das mais ignóbeis atrocidades e desgraças, que culminaram com um dos maiores êxodos do século XX envergonhando Portugal aos olhos do mundo civilizado.
Quando somos mal servidos num restaurante quer pela comida ou desleixo dos empregados, por norma não voltamos lá, nem o mesmo nos deixa saudades. Se vamos de férias a um país e nele somos agredidos e roubados, também muito dificilmente lá voltamos. Se vamos visitar um amigo e este a meio da noite por discordância clubista me insulta e expulsa de sua casa, pode ter a certeza que jamais lá voltarei. Este é o paradoxo de dois pesos e duas medidas que eu tento realçar e colocar em evidência quando se trata falarmos sobre Angola, em que a grande maioria dos ex-residentes voltaria amanhã se tivessem menos 30 anos de idade e lhes fosse facultada essa oportunidade mesmo que Angola mantivesse o governo actual.
Espero que a água do Bengo não tivesse efeitos que possamos considerar de poção mágica, e que tenha enfeitiçado quem a tivesse bebido transtornando-lhe a capacidade de analisar de forma racional todas as vicissitudes pelas quais passamos e de nos vermos indigente numa terra para muitos desconhecida que era Portugal, onde fomos mal recebido, mal-amados e ainda por cima de novo maltratados. Tenho que ser realista, e as saudades, do cheiro da terra vermelha e molhada, da gastronomia, paisagens naturais, pesca, caça, pores-do-sol e tudo o mais que angola tinha de maravilhoso não chega para me fazer esquecer a humilhação que lá passei.
Em meados de 1975 comecei a sentir na pele o medo e terror de lá deixar ficar os meus ossos aos 32 anos de idade, só porque a cor da minha pele era branca, isso tornava-me num proscrito com a cabeça a prémio pelos crimes de ter sido um explorador, colonialista, racista e por ter escravizado todos os negros que apanhava a jeito. As violentações pelas qual passei eu e a minha família no ano de 1975 fizeram com que tratasse angola como um cancro e quando cheguei a Portugal comecei de imediato a tratar-me com radiação e isso curou-me completamente ao fim de 5 anos, e agora com o distanciamento de 40 apenas olho para Angola com pena de que os males que a afligem não tenham cura.
A Angola que foi o berço da minha naturalidade e os Angolanos que foram meus colegas e amigos de estudo, desporto e até de emprego todos eles me atraiçoaram na altura que lhes competia demonstrar a sua solidariedade. Que ninguém me peça que olhe para Angola e para os Angolanos e que os veja puros e impolutos, pois todos eles têm culpas no cartório, pelas atitudes racistas que demonstraram ter punindo todos os portugueses e demonstrando por acções retaliatórias e vingativas todo o ódio que nos tinham, por termos ocupado o seu território durante 500 anos. Obvio que alguns portugueses tiveram comportamentos indignos em relação aos angolanos, mas isso não lhes dava o direito de nos escorraçarem a todos indiscriminadamente. Ouve certamente uma minoria de angolanos dignos e decentes que demonstraram ter carácter e sentido critico pois sabiam quem protegiam ou defendiam e esses poucos merecem ser louvados e reconhecidos. Se quem me ler desejar crucificar-me, tem toda a liberdade de o fazer, só espero que não tenham que me ressuscitar pelos acontecimentos que ainda hoje diariamente afectam os novos colonos brancos que procuram em Angola o emprego que lhes falta em Portugal e que um dia não voltem de lá também corridos, uma vez que não os diferencio nem são diferenciados pelos negros angolanos diferentemente dos portugueses que lá viveram até 1975.
16-5-2015
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